O regresso do doclisboa – VI Edição
As portas estão abertas, as melhores salas de Lisboa já foram ocupadas e a agitação já se faz sentir. Já começou a VI edição do doclisboa e durante dez dias é difícil fazer outra coisa que não inclua ir ver um dos filmes programados. Até 26 de Outubro a Culturgest, o São Jorge, o cinema Londres e o Museu do Oriente estão de olhos postos no mundo e quem por lá passar também sairá com novas visões.
Em 2007, na sua quinta edição, o doclisboa apostou em renovar o interesse do público pelo documentário e conquistou mais público. Este ano o doclisboa regressa e tem como objectivos principais mostrar filmes que provavelmente não chegariam cá se não houvesse o doclisboa; permitir uma reflexão mais aprofundada sobre temas contemporâneos e de actualidade; dar a conhecer de forma mais sistemática a cinematografia de outros países e organizar debates que mobilizem o público em torno de filmes importantes e de temas transversais, presentes em várias obras. No fundo o doclisboa tem um lugar de inquestionável importância na cidade lisboeta, criando oportunidades de reflexão, de conhecimento, de encontro cultural e o seu objectivo é conquistar a cidade documental. O doclisboa apresenta este ano, seguindo a sua linha conceptual, um programa de teor muito político, mas inova em determinados aspectos que surgem numa incursão pela conquista de novos públicos. O Doclisboa 2008 tem secções novas como a "Heart Beat", que reúne documentários sobre música, alguns inéditos em Portugal, como "O mistério do samba", que o realizador Lula Buarque de Hollanda mostrará em Lisboa, e "Let´s get lost", de Bruce Webber e sobre o trompetista Chet Baker. Haverá ainda uma programação nova, intitulada "Novas famílias, novas identidades", uma série de curtas-metragens da Polónia, entre as quais do realizador Krzysztof Kieslowski, e um destaque especial para a cinematografia de Moçambique. A programação do Doc Lisboa divide-se por várias secções, além das competições nacional e internacional. A secção Riscos e Ensaios apresenta algumas antestreias nacionais, como é o caso de "Hunger", Câmara de Ouro em Cannes, ou do último filme de Fernando Lopes, "O meu amigo Mike ao trabalho".
Diários Filmados II complementa o programa da edição anterior, com trabalhos sobre importantes nomes do documentarismo e da fotografia, como Joris Ivens, Raymond Depardon ou Robert Frank. Curtas Polacas e uma pequena mostra de documentários rodados recentemente em Moçambique complementam a programação. Salienta-se a retrospectiva de carreira do homenageado desta edição, Frederick Wiseman, documentarista norte-americano de 78 anos, que também marcará presença em Lisboa. Uma ocasião para ver ou rever a obra de um dos homens que, nos últimos quarenta anos, tem abordado grande parte das instituições norte-americanas, em filmes com cada vez maior actualidade.
Nan Goldin é outra das “estrelas” desta edição. Faz parte do júri internacional e traz até nós um dos mais originais olhares de fotógrafo dos dias de hoje, além de um filme sobre o seu percurso. O realizador Laurent Cantet e o escritor (e actor no filme) François Bégaudeau apresentarão em antestreia o vencedor da Palma de Ouro de Cannes deste ano, "A turma".
No total, serão exibidos cerca de 175 documentários, tornando o festival mais extenso. Destacam-se temas mais picantes – o sexo e o swing – e uma secção muito política – ‘Maratona Eleições’ – a três semanas das presidenciais dos EUA. A China é o país convidado. Sérgio Tréfaut avança: "Temos uma programação chinesa que interroga a China com um olhar muito especial e que não é um programa institucional, antes pelo contrário. Se alguém quiser compreender o que é a resistência na China tem isso nos nossos filmes", destacou o programador. O festival vai exibir 13 documentários independentes que seguramente “nunca foram exibidos na televisão chinesa”.
A abertura oficial do doclisboa deu-se ontem, com o nome sonante Avi Mograbi, cineasta israelita, que esteve presente com o filme “Z 32”, que está fora da competição. Sérgio Tréfaut tem razão quando o afirma como um filme inovador e perturbador. Versa sobre os crimes de Estado de Israel, relatados por um ex-soldado num registo muito íntimo, sobre os depoimentos do militar, partilhados com a namorada, ambos de rosto tapado. “Z 32” impressionou a crítica e o público no Festival de Cinema de Veneza e foi escolhido para a abertura oficial, com o acrescento de que no final o cineasta debateu com o público após exibição do filme. O filme de abertura repete no dia 18, no cinema Londres, às 22h30.
O filme de encerramento será "Maradona by Kusturica", que passa no dia 25, na Culturgest.
Este ano, a direcção do DocLisboa recebeu cerca de 1300 documentários, entre curtas e longas-metragens, dos quais escolheu 175. Foram seleccionados 14 para a competição internacional de longas-metragens, nove longas-metragens portuguesas e três curtas-metragens nacionais. Augusto Seabra, um dos comissários do DocLisboa, descreveu esta sexta edição como "a edição big bang", repleta de ousadias, de filmes-limites, de ficções do real. Com um orçamento de 900 mil euros, dos quais 110 mil euros são de apoio financeiro do ICA, 67 mil euros da câmara de Lisboa e da EGEAC. Em 2007, o festival contabilizou cerca de 33 mil espectadores, mas para este não há previsões. Certamente ultapassará os números anteriores, mas acima de tudo, ultrapassará as nossas expectativas, pela qualidade a que nos habitua, mas também por nos ter habituado a surpreender-nos ano após ano. O doclisboa desperta interesse para o documentário, fonte de enriquecimento, e tem um lugar único.
O Doc Lisboa passará nas salas da Culturgest, nos cinemas Londres e São Jorge e, este ano, numa primeira parceria deste género, também no Museu do Oriente. No final, a associação promete uns Estados Gerais do Documentário, a realizar de 27 a 29 deste mês, no Cinema Londres, porque a Apordoc, responsável pelo festival, comemora 10 anos, e porque é importante reflectir.
ANA MARIA DUARTE
Artigo publicado no Jornal Semanário (ed.17.10.2008)
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