terça-feira, 27 de janeiro de 2009

O Som e a Fúria – Sete de Abril, 1928

Leitura de uma colecção de memórias
Um capítulo complexo em cena


Na sexta-feira, dia 16 de Janeiro, pelas 21h30, no Palco do Grande Auditório da Culturgest, terá lugar a estreia europeia de “The Sound and the Fury (April Seventh, 1928) ” – O Som e a Fúria (Sete de Abril, 1928), um espectáculo de Elevator Repair Service que leva à cena o primeiro capítulo do romance de William Faulkner com o mesmo título. O espectáculo será também apresentado no sábado, 17, às 21h30 e no domingo, 18, às 17h00.

Em 2008, esta mesma companhia apresentou neste mesmo espaço uma encenação do texto integral de “O Grande Gatsby”, de Fitzgerald. “Gatz” foi considerado o melhor espectáculo do ano por parte da crítica nacional.

O grupo, que nas suas produções combina comédia slapstick, cenários de alta e baixa tecnologia, textos literários ou found-texts, objectos encontrados e mobília deitada fora, assim como um estilo coreográfico altamente desenvolvido, tem-se concentrado ultimamente em textos literários e regressa agora com a estreia europeia de “The Sound and the Fury (April Seventh, 1928) ”. Internacionalmente, o espectáculo estreou a 15 de Abril do ano passado no New York Theatre Workshop, com o apoio do Dartmouth College. Segundo o encenador, trabalhar com o New York Theatre Workshop foi um prazer, mas, simultaneamente, assustador. “Foi-nos fornecido espaço para ensaiar e imenso apoio, e tudo isso ajudou-nos a fazer uma peça muito ambiciosa. Mas eu estava nervoso porque, embora “Gatz” não tivesse sido visto por muita gente em Nova Iorque, tinha ganho uma grande reputação. E aqui estávamos nós, experimentando outro grande romance – e um muito mais difícil – com toda a gente à espera de algo como “Gatz”. E ainda por cima era garantido que teríamos muito mais público para esta peça, já que estaríamos a apresentá-la off-Broadway (em vez de off-off-Broadway).”


Depois da encenação de Fitzgerald, continuava a existir uma atracção pelo estilo claro, simples e modernista deste autor. A escolha de outro romance do mesmo período surgiu do abandono da ideia de escolher uma obra do mesmo autor, pelo risco associado de confronto com as soluções apresentadas anteriormente em “Gatz”. Desta forma, seguiram por uma opção que fosse próxima, mas que acaba por trazer um estilo e uma estrutura totalmente diferentes para o espectáculo. A prosa de Faulkner é enigmática e emocionalmente intensa. O capítulo escolhido, segundo John Collins apresentava o problema formal mais desafiante e o que abarcava mais tempo de narrativa, já que é composto da colecção de memórias de uma personagem ao longo de 30 anos. “O próprio Faulkner afirma ter escrito o capítulo de Benjy primeiro e insiste que apenas escreveu os capítulos seguintes como tentativa de explicar o primeiro.” É portanto a essência do livro.
Escrito em 1929, este texto vai contando a história do declínio da família Compson do condado ficcional de Yoknapatawpha, no Mississípi.
Descendente de um herói da Guerra Civil, o clã é vitimizado pelas limitações do Sul reconstruído – racismo, ganância e egoísmo. Desta forma Faulkner consegue mostrar que os ideais e a vida do velho Sul não se podiam manter ou preservar com facilidade depois da Guerra Civil. Sete de Abril, 1928, a primeira parte do romance, é contada do ponto de vista de Benjy Compson, que é mudo e tem a idade mental de uma criança. Esta primeira parte é uma das passagens mais temíveis da literatura americana. William Faulkner é conhecido pela complexidade estrutural da sua escrita.


A primeira parte de “O Som e a Fúria” é uma das passagens mais temíveis da literatura americana. Ao entrar na cabeça de Benjy – que descreve como “verdadeiramente inocente” – Faulkner escolheu saltar no tempo de um acontecimento para outro sem transição e, por vezes sem qualquer pista sobre o que está a fazer. A companhia transformou as dificuldades de levar à cena um texto literário tão complexo numa oportunidade. Nas palavras de John Collins, este capítulo “É uma incompletude narrativa (criada pela mente de Benjy, que salta constantemente de um tempo para outro, de uma memória para outra) que cria, através da acumulação, uma personagem completa (Benjy). Também cria um retrato completo daquela família. Na sua imperfeição, um conjunto de cenas desconjuntadas e cheias de arestas, este capítulo atinge o seu próprio tipo de perfeição. Ou, se não perfeição, atinge algo que é profundamente verdadeiro na sua desarrumação.”
Com Mike Iveson, Vin Knight, Aaron Landsman, April Matthis, Annie McNamara, Randolph Curtis Rand, Greig Sargeant, Kate Scelsa, Kaneza Schaal, Susie Sokol, Tory Vazquez e Ben Williams.

ANA MARIA DUARTE
Artigo publicado no Jornal Semanário (16.01.2009)

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