Festival de Curtas de Vila do Conde
Vila do Conde muda mesmo durante uma semana. As pessoas que por ali passam são outras. Este ano, no recém-estreado Teatro Municipal de Vila do Conde, estiveram no total 15 mil espectadores. Realizadores, actores e outros que tais, andam por ali, nos mesmos restaurantes, nos mesmos espaços, todos com o intuito de ver curtas, de saber o que se tem feito por cá e pelo mundo.
A programação da 17ª edição do Curtas deste ano era bastante heterogénea, e para além das sessões de cinema, havia ainda as oficinas, exposições e coisas para os mais novos. Na primeira noite do fim-de-semana estava programado um filme-concerto com Vinicius de Cantuária e Naná Vasconcelos. Vinicius não pode vir e veio antes Norberto Lobo, que já andava por lá desde o inicio do festival. Num primeiro momento musicaram o filme “Manhatta”, de 1929, onde se destacou a percussão, mas onde tanto o diálogo entre os dois, como o diálogo com o filme não funcionaram tão bem como no segundo momento, em que conversaram com as imagens de “Ny Ny”, de 1957, de Francis Thompson. Aqui, Norberto recorreu à guitarra eléctrica e foi possível viajar de novo a New York e entrar num mundo de imagens moldadas por sons.
No dia seguinte ainda passavam filmes a competição. À noite anunciavam os premiados. E logo a seguir puderam-se ver duas sessões de filmes que já tinham vencido. E assim foi possível ver a maioria dos filmes premiados.
Ao nível internacional, o grande prémio “Cidade de Vila do Conde” foi para “A História da Aviação”, um filme franco-húngaro, realizado por Balint Kenyeres. Uma família faz um picnic. São um grupo de pessoas de classe média-alta. A mãe não encontra a filha, que anda pelas montanhas a ver um voo até ao mar. É uma história situada na Normandia no início do século XX.
O prémio animação foi entregue a “Dust Kid” (Coreia do Sul), um filme de Jung Yumi. Fala de uma rapariga que encontra rapazes de pó, mas na verdade acho que Yumi nos queria contar da aceitação da sua criança interior, que por muito que ele a tentasse apagar voltou sempre. Um filme de uma simplicidade tocante, com movimentos delineados a preto e branco.
O prémio de melhor curta-metragem europeia foi para “Renovare” (Alemanha/Roménia), de Paul Negoescu, que nos dá 3 olhares sobre um mesmo momento, através de três personagens, e o prémio do Público foi para a animação francesa “Logorama”, de François Alaux, Hervé de Crécy e Ludovic Houplain, onde temos um mundo de marcas levado ao absurdo. A ironia do consumismo e do marketing levada ao extremo, através de um tumulto na cidade de L.A.
Na categoria dos vídeos musicais venceu “The BPA – Toe Jam” (Reino Unido) de Keith Schofield e na competição Take One!, o filme “Eu adoro este som!” (Portugal), de Zulmira Gamito, Filipe Fernandes e Rui Matos, que também explora o musical, mas o das crianças, fazendo-nos reflectir e rir sobre esta ideia do que sentem os miúdos através da música.
Uma das conclusões que surgiram ao sair de Vila do Conde foi o facto de muitos filmes explorarem o universo das crianças. Era o caso deste filme, mas também do vencedor “A História da Aviação” e de “Echo” que contava a história de dois rapazes que mataram uma rapariga, em que se explora o confronto com a realidade, aquilo que está por trás do acto, a influência dos pais no comportamento humano, como em “The Ground Beneath”, de René Hernandez, que venceu na categoria “Curtinhas”, que consiste numa viagem emocional de um jovem adolescente, Kaden, que vive uma vida de medo e ameaças, focado na figura do seu pai, mas que nos fala, com um olhar um pouco moralista, da oportunidade e da capacidade de mudança e auto-descoberta (pormenor estranho: um filme que explora a violência emocional estar enquadrado na secção “Curtinhas”, dedicada a um segmento infanto-juvenil).
Destaques ainda para “Madam Butterfly” (Taiwan), de Tsai Ming Liang, que ganhou o prémio ficção, e “Entrevista con la Tierra” (México), que venceu o prémio documentário.
Em competição nacional o vencedor foi “Canção de Amor e Saúde” de João Nicolau. O humor do realizador de Rapace continua sublime. Curtas de Vila do Conde chegou ao fim, mas com a promessa de que para o ano haverá mais.
ANA MARIA DUARTE
Artigo publicado Jornal Semanário (17-07-2009)
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