Feminine, de Paulo Ribeiro
Este fim-de-semana, o coreógrafo Paulo Ribeiro apresenta o espectáculo “Feminine”no Grande Auditório da Culturgest. Depois de “Masculine”, apresentado no Teatro Maria Matos (2007) o coreógrafo mostra-nos a sua visão do universo de Pessoa de saltos altos. Através de um quinteto de cinco mulheres (quatro bailarinas e uma actriz) viaja sobre as preocupações mais superficiais do sexo feminino: o cabelo, os saltos altos, os homens. Elas dançam com os corpos que transpiram sensualidade, em movimentos contidos que desaguam num prazer prolongado.
Paulo Ribeiro aproximou a dança de Pessoa, em 2007, ao criar “Masculine”, onde abordava o universo, de forma a mostrar as idiossincrasias de um homem: coisas quotidianas, mas não só. Uma bola de futebol e energia masculina estavam presentes a partir das vozes e corpos de quatro bailarinos. A pesquisa desenvolvida sobre a obra de Fernando Pessoa acabou por revelar a vontade de abordar a sua relação com as mulheres. Assim nasceu “Feminine”. Paulo Ribeiro substituiu a bola pelos saltos altos e mergulhou na beleza estética, na emocionalidade. Antes da estreia deste espectáculo no Teatro Nacional São João, o coreógrafo disse em entrevista: “A ideia de trabalhar Fernando Pessoa já me persegue há muito tempo. Mas pensei sempre em trabalhar não em torno da obra, mas do homem: aquele homem em particular, com os seus defeitos. Uma pessoa, não apenas um génio escritor. As pessoas são essencialmente humanas: à volta daqueles momentos geniais há muitos outros momentos, normalíssimos, banais.” Este quotidiano já era experienciado em “Masculine”, mas agora é muito mais claro, revelando o poeta das horas banais.
Pessoa é coreográfico no sentido em que vai escrevendo em sequência, existe uma evolução nos seus textos e Paulo Ribeiro explora muito bem essa visão. Em “Feminine” ele vai mais longe e o que acaba por surgir é o olhar de Pessoa sobre a mulher. A peça tem, tal como “Masculine”, uma componente muito humorística, e um lado muito sexual, explorado na fisicalidade: Ser o meu corpo passivo a mulher – todas – as mulheres; Que foram violadas, mortas, feridas, rasgadas pelos piratas; Ser no meu ser subjugado a fêmea que tem de ser deles; E sentir tudo isso – todas estas coisas duma só vez pela espinha!
As palavras do poeta desafiam as das mulheres em palco, que se deixam perder pelas suas próprias narrativas. A poética do movimento feminino percorre a peça, misturada com o ardor colocado em cada gesto. O espaço de sensações é apenas interrompido pela força maior do coreógrafo, de brincar com as suas criações, de as colocar a rir de si próprias.
Este fim-de-semana, o coreógrafo Paulo Ribeiro apresenta o espectáculo “Feminine”no Grande Auditório da Culturgest. Depois de “Masculine”, apresentado no Teatro Maria Matos (2007) o coreógrafo mostra-nos a sua visão do universo de Pessoa de saltos altos. Através de um quinteto de cinco mulheres (quatro bailarinas e uma actriz) viaja sobre as preocupações mais superficiais do sexo feminino: o cabelo, os saltos altos, os homens. Elas dançam com os corpos que transpiram sensualidade, em movimentos contidos que desaguam num prazer prolongado.
Paulo Ribeiro aproximou a dança de Pessoa, em 2007, ao criar “Masculine”, onde abordava o universo, de forma a mostrar as idiossincrasias de um homem: coisas quotidianas, mas não só. Uma bola de futebol e energia masculina estavam presentes a partir das vozes e corpos de quatro bailarinos. A pesquisa desenvolvida sobre a obra de Fernando Pessoa acabou por revelar a vontade de abordar a sua relação com as mulheres. Assim nasceu “Feminine”. Paulo Ribeiro substituiu a bola pelos saltos altos e mergulhou na beleza estética, na emocionalidade. Antes da estreia deste espectáculo no Teatro Nacional São João, o coreógrafo disse em entrevista: “A ideia de trabalhar Fernando Pessoa já me persegue há muito tempo. Mas pensei sempre em trabalhar não em torno da obra, mas do homem: aquele homem em particular, com os seus defeitos. Uma pessoa, não apenas um génio escritor. As pessoas são essencialmente humanas: à volta daqueles momentos geniais há muitos outros momentos, normalíssimos, banais.” Este quotidiano já era experienciado em “Masculine”, mas agora é muito mais claro, revelando o poeta das horas banais.
Pessoa é coreográfico no sentido em que vai escrevendo em sequência, existe uma evolução nos seus textos e Paulo Ribeiro explora muito bem essa visão. Em “Feminine” ele vai mais longe e o que acaba por surgir é o olhar de Pessoa sobre a mulher. A peça tem, tal como “Masculine”, uma componente muito humorística, e um lado muito sexual, explorado na fisicalidade: Ser o meu corpo passivo a mulher – todas – as mulheres; Que foram violadas, mortas, feridas, rasgadas pelos piratas; Ser no meu ser subjugado a fêmea que tem de ser deles; E sentir tudo isso – todas estas coisas duma só vez pela espinha!
As palavras do poeta desafiam as das mulheres em palco, que se deixam perder pelas suas próprias narrativas. A poética do movimento feminino percorre a peça, misturada com o ardor colocado em cada gesto. O espaço de sensações é apenas interrompido pela força maior do coreógrafo, de brincar com as suas criações, de as colocar a rir de si próprias.
No processo de trabalho de construção desta peça, a diferença entre homens e mulheres acentuou-se. Paulo Ribeiro afirma que “(…) com os homens havia uma grande margem de interpretação, apesar de os parâmetros estarem definidos, tanto que foi necessário refreá-la, travá-la. Em “Feminine”, pelo contrário, a peça está coreografada ao milímetro. As estruturas iniciais são mais sólidas e mais severas.” Neste espectáculo há um trabalho muito pop, no cenário, nos figurinos sentem-se os anos 70. Há uma certa nostalgia que passa não só pelo facto de Pessoa ser um escritor dessa época, mas também por Paulo Ribeiro se inspirar na respiração da esperança existente nessa altura.
O coreógrafo entrega tudo nas suas criações e isso transpira para quem o recebe com abertura. “Tenho a impressão de não viver se não morrer para voltar a viver”, diz Paulo Ribeiro. “É um combate permanente de que preciso. E salpico isso para os meus intérpretes.” Tanto em “Feminine” como em “Masculine” sente-se um esgotamento por parte dos intérpretes, que depois nos possibilita ver a sua verdade, mostrando sempre actividade. A sua natureza é essa, a de mexer com as pessoas através de abanões efervescentes.
Há questões que nos acompanham sempre, há pessoas que estão sempre presentes, há dúvidas que não devem ser esclarecidas, elas são a razão para se estar atento. Não são precisas respostas. Precisamos sim de encantamento, precisamos de praticar a simplicidade para atingir o fascínio da multiplicidade.
ANA MARIA DUARTE
Artigo publicado no Jornal Semanário (ed. 21.11.2008)
Fotografias de José Alfredo
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