segunda-feira, 25 de agosto de 2008

A efervescência do mercado das artes

Olhar sobre 2007
Tendências, perspectivas e estatísticas


O mercado das artes tem-se revelado algo que alicia os investidores, principalmente nos grandes centros de Nova Iorque e Londres, mas também nos países em crescimento como a China, a Índia e os Emirados Árabes Unidos. Líder na área, ao nível mundial, a Artprice é conhecida por ser a melhor empresa no acesso à informação, no que se refere a este universo. Os seus bancos de dados cobrem 405.000 artistas, que contemplam o período desde o ano 4 até aos dias de hoje. As categorias abrangidas passam pela pintura, aguarela, desenho, tapeçaria, posters, escultura, instalação, fotografia, audiovisual e multimédia. Olhamos, através do relatório “Art Market Trends 2007”, publicado pela Artprice, para os resultados do ano passado e para as tendências de um mercado em crescimento.

Foi divulgado recentemente um relatório sobre as tendências do mercado artístico do ano de 2007, que revela essencialmente uma subida geral dos preços, pelo sétimo ano consecutivo. Havia já uma procura por parte da China, da Rússia, da Índia e até dos Emirados, mas agora nota-se um risco crescente por parte de novos coleccionadores e de fundos de investimento que mostram interesse por formas alternativas de investir. Estes “jovens coleccionadores” têm uma apetência maior para obras de arte contemporânea, o sector que se apresenta como o mais volátil, mas também o mais líquido do mercado. Neste contexto favorável, a França caiu para a 4ª posição nos rankings mundiais, atrás da China, apesar de manter excelentes performances nos leilões.
A especulação atingiu o seu pico no ano passado, no que diz respeito ao mercado das artes, atingindo 18% de aumento dos preços. Neste ano, vendeu-se um total de 9,2 biliões de dólares, correspondente a uma progressão de 43,8% relativamente a 2006. O número de vendas também aumentou de 810 para 1254 batendo o recorde do número de transacções anuais.
O final do ano, apesar de ninguém esperar um mercado tão forte nos meses de Novembro e Dezembro, dada a crise financeira que se tinha sentido em Agosto, com uma bolsa mundial muito sensível e uma economia americana inquieta, foi marcado por um conjunto de vendas espectaculares, principalmente no segmento da arte contemporânea. Novembro foi o mês em que a Sotheby’s registou a sua melhor venda de sempre, no dia 14, com um total de 316 milhões de dólares numa “Contemporary Art Evening”. No dia anterior, a sua rival Christie’s tinha conseguido 325 milhões de dólares na venda de obras de arte contemporânea.
Conclui-se que o mercado da arte, cada vez mais globalizado, parece ignorar a turbulência financeira em que se vive e tem apresentado resultados dinâmicos que parecem advir de uma onda de novos ricos, que apostam no coleccionismo, oriundos de países em grande crescimento, tais como a Rússia, a China e a Índia.
Se olharmos para a diferença significativa de preços entre a década de 90 e os dias de hoje, percebemos que foram muitos aqueles que se aproveitaram da efervescência do mercado, tendo adquirido numerosas obras de arte há alguns anos por um preço muito mais baixo, que agora voltam a surgir no mercado por preços exorbitantes. Basta analisar algumas das negociações mais recentes para vermos o quão lucrativo poderá ser o investimento na arte. Por exemplo, um retrato de Elisabeth Taylor, assinado por Andy Warhol foi adquirido por Hugh Grant há seis anos por 3,25 milhões de dólares e vendido no Christie’s por 21 milhões, o ano passado. Ou por exemplo a obra “Waterllo Bridge” de Claude Monet que foi apanhada na especulação em 1990 (o último pico especulativo do mercado), tendo sido vendida a um coleccionador americano em Londres, por 16 milhões de libras, um preço bastante superior àquele que o proprietário tinha pago há 17 anos atrás.
Contudo, uma das tendências que se verifica é o facto de estas operações lucrativas não se limitarem aos segmentos mais altos dos coleccionadores. Até no segmento que tem como limite os 10.000 euros, que corresponde a 90% das transacções do mercado, tem apresentado investimentos proveitosos. Aliás, há inúmeros exemplos que ilustram a especulação do mercado. Uma das formas de aumentar a licitação de uma obra é a simples transacção para uma outra leiloeira num país diferente. Por exemplo “Jeune fille avec chat et fleurs” de Odilon Redon foi comprado por 3.200 euros no espaço da Christie’s, em Paris, em Dezembro de 2006, e vendido por 9.500 euros três meses mais tarde em Londres, à Sotheby’s. Outro exemplo gritante foi “Danza, danza all’erta fratellino”, de Mimmo Paladino, que foi adquirido por 8.735 euros, em Junho de 2006, em Londres, e vendido por 30.000, doze meses mais tarde, no “Meeting Art” (Vercelli).
Este nível de preços excepcionais começa a parecer cada vez mais interessante aos investidores, tendo ainda em conta o ambiente económico que envolve a sociedade. Afinal, o mercado da arte é o único que se parece manter imune à economia global e à turbulência dos mercados financeiros.
A Artprice adivinha que o ano de 2008 seja um ano de “correcção”, tendo em conta a volatilidade do mercado. Pode-se esperar uma manutenção dos valores se olharmos para alguns catálogos com preços estimados e com espaços que levarão algum tempo até liquidar os stocks. Depois do início de uma correcção de preços não vai tardar muito, possivelmente, a um decréscimo mais veloz. Entre 1990 e 1992, por exemplo, houve uma contracção de 44%, sendo que 1990 se pode assemelhar de alguma forma ao ano de 2007. Assim, espera-se que depois de um grande pico, haja uma contracção do mercado.
Ao analisar os dados de 2007 passa a impressão de que a arte é particularmente atractiva para os especuladores e o apetite dos vendedores parece ter crescido de venda para venda. Para saciar esta vontade e simultaneamente criar as vendas mais espectaculares, os dois maiores rivais, Sotheby’s e Christie’s, entraram num verdadeiro jogo de licitação, num mercado cada vez mais competitivo. Contudo, num determinado momento, houve uma inversão do jogo, sendo que as duas leiloeiras tiveram de começar a dar algumas garantias nos preços de venda. Até porque este jogo se tem vindo a mostrar bastante perigoso. Por exemplo, a Sotheby’s, a 7 de Novembro de 2007, nas vendas do “Impressionist & Modern Art”, tinha apresentado um preço mínimo para as obras de Van Gogh e de Braque apresentadas, estimadas em 28-35 milhões de dólares e 15-20 milhões, respectivamente. Porém estes preços não foram atingidos e os espaços tiveram de se tornar os seus próprios compradores. A reacção do mercado, nesta altura, foi quase imediata.
Conclui-se que tivemos, durante este ano, um mercado altamente competitivo, sendo que a Christie’s continua a deter a maior quota de mercado, com 38,7%, e a Sotheby’s 36%. Juntos e individualmente, estes contam com praticamente a totalidade do volume global dos leilões. Em 3º lugar temos Philips De Pury (2,6%), Paly International Auction (1,8%), China Guardian (1%) e Artcurial (0,9%).
De forma a estender a sua quota de mercado e influência, as leiloeiras têm vindo a abrir espaços-satélite naqueles que são os mercados em crescimento, tais como a China, a Índia e os Emirados, tendo este último contado com 43% da totalidade dos leilões gerada em 2007.
Nova Iorque perdeu 1.39 pontos, em termos de quota de mercado, ao nível internacional. Durante este ano NY consolidou a sua posição em termos de líder de mercado, uma vez que conseguiram atrair peças excepcionais para os leilões e apresentaram preços 71,5% mais altos do que em 1990 (altura do último pico). Pela primeira vez foi a arte contemporânea e do pós-guerra que gerou a maior fatia das vendas, ultrapassando os Impressionistas e o Modernismo. As três maiores vendas aconteceram entre 15 e 17 de Maio, com Mark Rothko, com o “White Center”, datado de 1950 (65 milhões de dólares), Andy Warhol, com “Green Car Crash” (1963) por 64 milhões de dólares e “Study from Innocent X” de Francis Bacon (1962) por 47 milhões.
Outro dos booms deste ano foi o crescimento de Londres, a capital do mercado Europeu, com uma subida de 2,5 pontos na quota de mercado que atingiu os 30%. Uma das razões para a melhoria dos leilões foi o valor dos trabalhos de inúmeros artistas britânicos. Os vectores do sistemático sucesso dos leilões nesta cidade são as obras de Francis Bacon, Damien Hirst, Lucian Freud e Bansky.
Um ponto importante a referir é que a França foi destronada do habitual terceiro lugar, agora ocupado pela China, que este ano atingiu um nível superior. Este nível reflecte-se no número de leiloeiras e no volume negociado, sendo cada vez mais um mercado a entrar na competição, tendo neste momento mais de 100 empresas a organizar os catálogos de vendas de “Fine Art” da China. A França é a única que parece estar em crise, no que diz respeito ao mercado da arte. De uma forma global, os artistas nascidos depois de 1945 representam 9,9%, enquanto que em França representam apenas 2,8%. O público trespassa a ideia de continuar agarrado ao passado e especializado em retrato e fotografia primários. Este declínio tem desapontado os mais atentos, que revelam que 2007 não foi um bom ano para este país. O top na arte contemporânea francesa foi Robert Combas.





Artigo publicado Jornal Semanário - Abril 2008

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