segunda-feira, 25 de agosto de 2008

A vida é Perto - Entrevista com Olivia Byington

Olivia Byington é uma mulher que dá vontade de conhecer e ouvir. Cantou com Jobim, trespassa uma energia positiva, tem uma voz intimista e forte simultâneamente, e ainda consegue ser incrivelmente simpática, falando com naturalidade dos seus percursos. Chega agora a Lisboa pela mão da Mandrake.

A cantora brasileira lançou o seu décimo disco em 2005 em Portugal e só em 2006 no Brasil. O acontecimento deveu-se ao facto da cantora sentir este disco como “o mais português”. O disco é composto, quase na sua totalidade, por um conjunto de músicas compostas em parceria com o poeta português Tiago Torres da Silva, além disso recorre a arranjos do virtuoso guitarrista Pedro Jóia.
Em termos de digressão a opção foi inverter o percurso: Olivia começou pelo Brasil onde teve uma série de lotações esgotadas durante catorze semanas no Teatro Laura Alvim no Rio de Janeiro e uma grande digressão que passou por São Paulo, Porto Alegre, Curitiba, Recife, Belo Horizonte. Antes de vir para Lisboa, a cantora passou ainda por Paris. Ontem foi o primeiro dia do espectáculo “A vida é perto” em Lisboa. O espaço escolhido é o Teatro Mundial porque este é um espectáculo que, como o nome indica, precisa de estar perto das pessoas, precisa de um ambiente intimista.

Combinei esta entrevista por três vezes, mas acontecia sempre um qualquer imprevisto que não nos deixava conversar. Mas a vontade subsistia e marcámos uma nova data. Olivia estava em Paris para um concerto e eu finalmente tinha o número de telefone certo. Tocou uma ou duas vezes e aí apareceu a voz de Olivia: - “Oi Ana, finalmente!”, dizia ela, “Vamos conversar!”. Olivia falou-me da sua vida e da sua paixão por Portugal, da sua temporada de concertos no Brasil, em Paris e do espaço onde vai tocar em Lisboa durante 10 dias.

Ana Maria Duarte: Como aconteceu essa parceria com o Tiago Torres da Silva?
Olivia Byyington: Conheci o Tiago há muitos anos, ele é o músico português que melhor faz a ponte entre o Brasil e Portugal. Temos uma relação muito natural, genuína mesmo. Quando eu estava a pensar voltar a compor e estava trabalhando com umas músicas do Caetano, o Tiago me enviou uma letra (em 2005) e eu me apaixonei por ela, houve uma grande identificação e ele foi enviando as músicas e elas faziam sentido num só disco. Aí o Tiago estava morando na casa do Pedro Jóia, que é um músico excepcional, e eu falei com ele para fazer dois arranjos no disco, que ficaram . Quando o disco estava pronto, eu senti que fazia mais sentido o disco ser lançado primeiro aí em Portugal, só no ano seguinte foi lançado pela “Biscoito Fino” lá no Brasil.

AMD: Mas depois inverteu a ordem quando chegou a hora de entrar em palco.
OB: É, eu comecei pelo Brasil, queria trabalhar o show. Foi a primeira vez que fiz um espectáculo só com voz e violão, é muito intimista e já fiz quase muitos shows lá no Brasil, agora Paris e depois Lisboa.

AMD: Como está a correr a digressão?
OB: O show está fazendo muito sucesso e foi muito bem recebido no Brasil. Tem grande autonomia e eu prescindi de toda essas purpurinas para viajar mais na escala humana. É uma grande alegria porque tem muita proximidade, funciona tudo dentro de relações pessoais, as pessoas têm reagido muito bem. Tenho tido sempre casa cheia e as críticas também têm sido muito boas. Cada noite que eu faço este show tem sido uma benção.

AMD: Tem algum grande ídolo com quem gostasse de tocar?
OB: O meu grande ídolo é Tom Jobim, mas eu tive a oportunidade de tocar com ele. Conheci-o na infância, foi uma espécie de mestre, foi maravilhoso. Mas hoje em dia há compositores muito bons, tem Lenine, Seu Jorge.

AMD: A Olivia tem uma música neste seu último álbum que parece uma homenagem a Lisboa e à luz desta cidade. Conte-me essa história.
OB: Essa música quase que foi encomendada ao Tiago. Eu estava num quarto em Lisboa, na zona do Bairro Alto, e fui totalmente inspirada pelo ar da Primavera. Essa luz e esse ar entrava pelas janelas e eu fui tocando, pedi ao Tiago para escrever os versos e ía sentindo a música a crescer, com uma simplicidade única.

AMD: A escolha do Teatro Mundial em Lisboa foi sua ou da Mandrake? Esta é a segunda vez que este espaço recebe um concerto. O primeiro foi com Seu Jorge, há pouco tempo, também pela Mandrake, num concerto único. O concerto de Seu Jorge foi mais um encontro, foi muito íntimo também.
OB: Eu disse à Mandrake que queria um espaço assim, íntimo, com muita proximidade, até pelo tipo de show e eles arrumaram esse espaço para mim, mas estou a ver que vai ser muito bom.

AMD: Como vê a música brasileira nos dias de hoje, com todos os mestres que já teve e os novos génios que a propagam pelo mundo?
OB: A amplitude que a música brasileira tem é muito boa, é uma música de um continente e há grandes músicos vivos, mas há muita gente que coloca a música brasileira dentro da música do mundo, principalmente os americanos. A música brasileira é música de um continente, não é música do mundo. É uma referência universal, tem sons únicos, que hoje em dia são misturados. O lounge mistura-se com a bossa nova. É essa a beleza, das misturas, porque é bastante rica. Música brasileira tem músicos incríveis com quem já trabalhei: Chico Buarque, Tom Jobim, tem sido uma honra conviver com estes génios da música brasileira.

Olivia é uma pessoa com uma energia incrível e com experiências únicas. Até ao dia 24 poderá ser ouvida no Teatro Mundial. A sua voz e um violão vão criar noites mágicas e com uma intimidade que desde o início será transmitida, possibilitando ao público uma entrega tal que sentirá que viveu o espectáculo. Numa altura em que vivemos nesta era da imagem, da multimedia, em que tudo é trabalhado neste sentido estético e de foco nas imagens, Olivia contraria esta linha, fazendo um espectáculo intimo e único, que quer proximidade e partilha.

Artigo publicado no Jornal Semanário - Fevereiro 2008

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