quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Tranquilidade da voz


Poderia ser a mesma coisa ouvir os Kings of Convenience ao vivo ou em disco, mas não é. O duo norueguês é de uma qualidade excessiva em estúdio, e em palco assume-se como algo inédito. Talvez por isso muitos daqueles que os tinham visto na Aulga Magna não tenham ido à Cidadela de Cascais, mas outros foram e penso que não se arrependeram. A ambivalência de ambos os músicos foi notável. As duas guitarras suaram com suavidade e a tranquilidade das vozes de Erlend Pye e Eirik Glambek foram invadindo a noite, com canções de “Quiet is the New Loud” e canções de “Riot on an Empty Street”. Aquilo que mostraram do terceiro álbum parece trazer mais ritmo, mas continua a ser suave.

Glambek dominou, como sempre, o caminho do concerto, a condução das canções e é essa a sua esfera. “Cayman Islands”, “Love Is No Big Truth” ou “I Don't Know What I Can Save You From You” mostraram isso. Oye, por sua vez, chama a atenção não só pelo seu ar um pouco fora do normal, com os seus óculos e a sua cabeleira ruiva, alto e meio desengonçado, mas com muito estilo, e pelas piadas que vai fazendo. O primeiro imprevisto aconteceu e foi a origem de uma noite com muito e bom humor. A demora em chegar o capo para a guitarra lançou Oye para uma performance além da música. “Singing Softly to Me” antecedeu, imprevistamente, “Homesick”. Mudar o alinhamento naquele momento foi uma forma que encontraram para que depois pudessem sempre improvisar de um modo sublime.

Mais tarde outra surpresa, além das canções novas que foram mostrando. Passaram a quatro instrumentos de cordas, com a junção do contrabaixo e do violino, e o piano passou a ser regra. “Stay Out of Trouble” deu início ao primeiro show improvisado de “mouth trumpet” de Erlend Oye. Parecia ele que já estava a desejar que pudesse não tocar guitarra durante esse concerto. E isso acabou por acontecer. A guitarra estragou-se. Não havia outra e deu-se nova mudança no alinhamento. O “trompete” foi ganhando espaço no improviso, lançado ainda mais longe com o piano em “I’d rather dance with you”, quando a falta da segunda guitarra já tinha deixado o plano das inconveniências.

Durante um tempo senti que tudo girava à volta de Oye, mas eis senão quando ele abandona o palco para deixar brilhar Eirik Glambek. Sozinho, em encore, cantou em português “Corcovado” de Tom Jobim, apenas acompanhado da sua guitarra. Nem a posterior aparição de Oye para o seu encore pessoal, com um improviso meio louco, chegou para interromper a suavidade e a tranquilidade da voz conseguida em “Miisread”. Um concerto bem diferente do da Aula Magna, igualmente especial e revelando uma dupla cada vez mais com um carácter surpreendente e infalível.

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