segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Entrevista a Diogo Infante

Diogo Infante regressa ao cinema para interpretar uma personagem no filme “Animal”, de Roselyne Bosch. O actor interpreta um serial-killer, papel que encarou como um verdadeiro desafio. A sua prestação espelha uma vez mais a sua qualidade no mundo artístico, depois de já ter passado pelas áreas da televisão, do cinema e do teatro, enquanto actor e também Director Artístico do Teatro Maria Matos.
O filme conta a história de Thomas Samarkand (Andreas Wilson), doutorado em biologia molecular e Iparrak (Diogo Infante), um serial killer conhecido por “O Caçador”. Thomas descobriu um modo de anular os genes responsáveis pela agressividade e testa a sua descoberta em Iparrak, experimentando em si mesmo o inverso. “Animal” é um filme que nos faz acordar para os perigos da sociedade contemporânea e que nos traz Diogo Infante num dos melhores papéis da sua vida. Falámos com o actor sobre a sua paticipação nesta co-produção francesa, inglesa e portuguesa.

Ana Maria Duarte: Como surgiu a proposta de trabalhar neste projecto?
Diogo Infante: Fiz um casting com a Patricia Vasconcelos, que estava à procura de actores para fazer alguns pequenos papéis e fui escolhido para fazer um personagem que se chama Doctor Sebastian, um rival do protagonista. A certa altura houve um problema com um dos actores prinicipais, que fazia o psicopata, e foi afastado do filme. A Roseline convidou-me para saltar de um papel para o outro e fazer o psicopata. Em 24 horas dei por mim a fazer uma personagem completamente diferente. Foi uma aventura, mas foi giro.

AMD: A construção da personagem foi então bastante rápida. Como é que foi esse processo e o fazer um psicopata, que é uma personagem bastante diferente?
DI: A construção foi muito rápida (risos). De facto não tive tempo para me preparar e agora em retrospectiva, acho que ainda bem. Normalmente o que eu teria feito era ver uma série de filmes, teria lido, teria pensado e depois ficava ali em pânico, a pensar como é digerir toda a informação. Assim não tive tempo para nada, foi um processo com algum risco, o que para mim foi bom, porque normalmente sou muito racional, muito cerebral. Claro que durante as filmagens ainda tive tempo para ler um livro sobre psicopatas, com descrições tenebrosas, e que serviu para perceber a lógica e o tipo de raciocínio, se é que é possível entender.
Depois foi construi-lo juntamente com a Roseline, cena a cena. Havia já algumas premissas muito bem definidas no guião, o personagem estava muito bem construído no próprio texto e isso ajudou.
O grande truque quando se faz um personagem tão monstruoso é não querer mostrar o monstro. Quanto mais tu quiseres mostrar um homem que matou, violentou, desmembrou, que, literalmente, comeu mulheres, mais difícil se torna. Como é que se mostra isto? A ideia é tu pensares: no essencial, na sua aparência um psicopota é uma pessoa como nós. Todos nós somos potencialmente agressivos e assassinos. Se calhar não somos todos potencialmente psicopatas mas todos temos a capacidade de agressão. E portanto aquilo que eu tentei fazer, juntamente com Roseline, foi ir por caminhos que nos permitissem desenvolver as linhas de conflito e depois dessem a nuance à personagem.
A certa altura ele é sujeito a uma experiência, no sentido de tentar anular o gene da agressividade e acaba por se confrontar com a dimensão daquilo que fez, por ter a noção de culpa, do remorso, que é uma coisa que normalmente não têm, porque são seres amorais. E de repente aquilo é muito violento, ele tem dificuldade em abarcar a amplitude do que tinha feito. Por outro lado eles são personagens muito sedutoras, muito inteligentes, normalmente têm um QI acima da média. Têm brio naquilo que fazem. E a ideia é fazer a personagem sem o julgar, ter ternura por ele.

AMD: Pelo teu discurso, gostaste de fazer esta personagem.
DI: Adorei fazer esta personagem, deu-me imenso gozo.

AMD: Tendo em conta os temas tratados no filme, como as mutações genéticas e a violência e o caminho da sociedade actual contra a violência, qual achas que vai ser o impacto no público e na sociedade?
DI: Esta é uma questão bastante pertinente. A Roseline falou com profissionais e cientistas da área. E há aqui questões de ordem ética que são cruciais. Até que ponto é que deve ou não haver manipulação genética e quais são as consequências disso? Se aplicarmos só às excepções quem é que as define, onde é que estão os limites?
Claro que esta ideia de podermos aniquilar, anular ou identificar o gene da agressividade é altamente discutível, porque o homem não seria o que é se uma parte da sua condição não passasse pela agressividade, pela violência. Se nós anulássemos isto o que seria de nós? O filme não dá resposta, mas levanta esse véu. Espero que as pessoas pelo menos possam reflectir um pouco sobre isso e tomar consciência de qual é a posição que podem vir a tomar no futuro, pois acho que estamos a falar de coisas que já estão em cima da mesa.

AMD: Achas que o filme vai ser bem recebido em Portugal?
DI: Não sei, é uma boa questão. Acho que é um filme muito honesto, ágil e bem realizado, uma primeira obra de uma jovem realizadora. Dada a temática, acho que vai haver comparações com o “Hanibal”, mas depende de como as pessoas querem olhar para o filme. Para mim o importante, e é isso que vou reter sempre desta experiência, é o enorme prazer que a experiência me deu. Estou muito orgulhoso do resultado. É obvio que o filme tem algumas fragilidades, mas acho que é um filme acima da média e por isso espero que as pessoas estejam na disposição de o ver e de o receber.
Artigo publicado no Jornal Semanário - Setembro 2006

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