segunda-feira, 25 de agosto de 2008

"Reset", performance de teatro musical


“Reset” é um espectáculo único, que encerra o Festival Temps d’Images, a decorrer em Lisboa, desde 3 de Outubro. “Reset” conta com uma apresentação única, no dia 18, no Grande Auditório da Culturgest, um dos espaços que acolheu o Festival.

O Festival Temps D’Images tem por principal conceito oferecer artes do palco, em composição com a arte da imagem. Contando já com a sua 5ª edição em Portugal e produção da DuplaCena, ocupa vários espaços de Lisboa. A Culturgest tem o privilégio de encerrar o Festival, com a recepção de “Reset”. Este espectáculo não foge à regra da essência do festival: o cruzamento da performance, do teatro, da imagem e, neste caso, da música.
“Reset” parte de três textos de Samuel Beckett: “What would I do without this world?”, um poema, “Cascando”, uma peça de rádio, e “Ohio Impromptu”, uma peça de teatro. Destes três textos e da reflexão sobre eles surgiu o guião, seguido por um actor, seis músicos e um compositor de vídeo (Sandro Aguilar). A dramaturgia e direcção artística são de Vasco Mendonça, que assina também toda a composição musical, e Nikolaas Vande Keere (UR Architects), que assume também a concepção espacial. Caroline Petrick assina a direcção de palco e a produção executiva é de VH Produções.
A utilização de três textos de natureza diferente prende-se com a evocação da diversidade de meios que caracteriza o universo Beckettiano, explorando uma evolução desse mesmo universo. Para além da natureza musical dos textos de Beckett, há também uma reflexão sobre o cruzamento das disciplinas, sendo que, em algumas peças tardias, são realizadas experiências numa esfera interdisciplinar. Surgem, enquanto personagens, luz, voz e música. É isso que sentimos em “Reset”, o ponto em que luz, som, actores e espaço se transformam em personagens, são agentes de revelação de uma coreografia existencial de diferença e repetição, de proximidade e ausência, do próprio e do outro.
Num respeito artístico à obra de Beckett, a exploração de Vasco Mendonça neste universo torna-se uma viagem única, numa perfomance que experimenta todas estas artes.
O espectáculo explora o conceito de controlo: parar, recomeçar, abrir, fechar, ouvir, falar, parar, recomeçar. Reset caminha da palavra para a música, da luz para a escuridão. “Um poema, uma peça de rádio, uma peça de teatro. Cada um com uma combinação de música e palavra. Em cada um uma actividade, um movimento em direcção ao silêncio, que inevitavelmente pára – um momento antes do silêncio. Para que possa começar de novo.”, explica Vasco Mendonça.
O compositor é já reconhecido internacionalmente, pela execução de obras em Portugal e Holanda, das quais se destacam as estreias mais recentes: “Procession”, no IX Festival Internacional de Música de Mafra, “Plurabelle”, que lhe valeu o Prémio Lopes-Graça de Composição 2004 e “The Boys of Summer”, apresentado no Haarlem International Choir Festival em 2003.
Em palco, um actor, um soprano, um contratenor, um barítono, um violino, um violoncelo e dois clarinetes, teatro à direita do palco, música à esquerda. Uma cortina esconde e revela personagens, onde o filme é projectado.
Vasco Mendonça reflecte o processo de desintegração do universo de Beckett. Nas palavras do próprio: “Na sua essência, os textos de Beckett são sobre eles mesmos, sobre a narração de histórias, o teatro, a comunicação. Ao contar uma história, actuamos na peça, tornamo-nos o seu tema. Reset é o ritual desta transformação, uma contaminação da realidade com uma ficção aparente, a afirmação da performance como a inevitável condição humana.”
“Reset” é uma reflexão interdisciplinar sobre música, teatro, imagem e espaço. A ideia das temáticas cruzadas e das artes do palco com a arte da imagem são conceito do próprio festival. “Reset” é também por isso uma peça sobre a tentativa de juntar diferentes disciplinas., procura a sua união, mas também nos conta sobre a impossibilidade de as fundir completamente. Uma narrativa musical de uma intensidade brutal, uma viagem entre universos, para assistir dia 18, na Culturgest.

Artigo publicado Jornal Semanário - Outubro 2006
Fotografia de Susana Moura

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